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27 de Abril de 2024
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    Terceirizar é degradar a condição humana no trabalho, afirma sociólogo em evento na Escola Judicial

    O primeiro "Fim de Tarde" de 2014 da Escola Judicial do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) recebeu, nesta quinta-feira (10/4), o professor de sociologia do Trabalho da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), sociólogo Ricardo Antunes, e o ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST), José Roberto Freire Pimenta. Os palestrantes abordaram o fenômeno da terceirização e a precarização do trabalho. O tema é bastante atual, dada a tramitação, no Congresso Nacional, do projeto 4.330/2004, que estende a terceirização às atividades-fim das empresas. O evento foi prestigiado por desembargadores, juízes e servidores da 4ª Região, e demais interessados pelo assunto.

    "Impedir o PL 4.330 é vital"

    O primeiro a palestrar foi o sociólogo Ricardo Antunes. O professor iniciou sua explanação explicando que o século XX foi "o século do automóvel". Isto porque, segundo o estudioso, o engenheiro norte-americano e teórico da Administração Frederick Taylor concebeu um modelo em que a cúpula da empresa (gerência) teria o papel de administrar, enquanto os trabalhadores braçais deveriam apenas executar o trabalho, conforme regras rígidas, inclusive quanto ao tempo de cada atividade (o cronômetro como símbolo da sua teoria). Estes conceitos encontraram-se com o modelo implementado por Henry Ford, fabricante de automóveis, para quem a empresa deveria produzir em grande escala e ao mesmo tempo propiciar o consumo em massa. Ou seja, seus automóveis deveriam popularizar-se ao ponto dos seus próprios operários conseguirem comprá-los. Este modelo, que predominou praticamente durante todo o século XX, é conhecido na Sociologia do Trabalho como Fordismo.

    Entretanto, de acordo com o professor, esta concepção pressupunha o consumo massivo dos bens produzidos, o que não foi compatível com a crise do capitalismo ocorrida no início dos anos 70. "Com desemprego em alta, quem compra automóveis? Os estoques encalharam", observou. Tal cenário fez com que o capital produtivo elaborasse uma contra-ofensiva, no sentido de adequar e flexibilizar sua produção. Este novo modelo ficou conhecido como Toyotismo ou acumulação flexível, em que a produção é regulada pela demanda. "Acabam-se os grandes estoques. A empresa produz quando o consumidor compra o carro" , explicou. "Não há mais grandes plantas industriais, mas sim muitas plantas pequenas interligadas pela informática, com poucos trabalhadores", detalhou.

    Para que este novo modelo fosse bem sucedido, era preciso que não só a produção fosse flexível, mas também a criação de uma classe trabalhadora flexível. "É a lógica da sanfona: quando o mercado está em alta, contrata-se muito; em seguida, despede-se" , ensinou. "Mas para contratar e logo depois descontratar, era preciso quebrar a coesão da classe trabalhadora e desregulamentar seus direitos" , analisou. "A empresa poderosa passou a ser aquela que tem poucos trabalhadores na gerência e milhares de empregados terceirizados. Empresa bem sucedida é a que tem 50 trabalhadores, não a que tem milhares, como no Fordismo", destacou.

    Conforme o sociólogo, é nesse contexto que surge a terceirização. Segundo ele, o discurso utilizado pelo empresariado é que o fenômeno qualificaria a mão de obra, por exigir maior especialização. "Mas não falam que existem muito mais acidentes entre os terceirizados. Muito mais burla às leis trabalhistas, já que as empresas simplesmente somem e não pagam direitos", exemplificou. A terceirização, no ponto de vista dos capitalistas, também geraria mais empregos, mas Antunes observou que um terceirizado trabalha, em média, três horas a mais que o empregado direto. "Não é preciso ser muito esperto para constatar que a terceirização desemprega trabalhadores diretos da empresa", ponderou. "A terceirização é vital para o capital".

    No entendimento do sociólogo, há três motivos básicos para a existência da terceirização. O primeiro seria a redução dos custos. Em segundo lugar, a porta que se abre para a fraude trabalhista, já que é a terceirizada que deve arcar com os direitos do empregado. Como terceiro objetivo, está a divisão da classe dos trabalhadores, com a quebra de sua unidade e estímulo à falta de solidariedade. "Terceirizar é fragmentar. Os terceirizados são diferentes dos empregados diretos, e diferentes até mesmo entre si", frisou.

    Antunes ressaltou que a terceirização está ligada à informalidade e à precarização no trabalho. "Se uma limpadora de quartos de hotel diminuir meio minuto em cada quarto que limpa, ela conseguirá limpar mais cinco quartos por dia. E se ela adoecer dentro do quarto, não pode nem sentar na cama ou na cadeira do quarto, precisa ir até um lugar determinado pela empresa para isso" , ilustrou. "A Foxcom tem trabalhadores na China e também no Brasil. Produz peças para grandes empresas de tecnologia e telefonia. Em 2010, 17 empregados desta empresa tentaram suicídio. Treze chegaram a um desfecho trágico" , lamentou, citando como exemplo, ainda, uma multinacional de supermercados que chegou a sugerir que os trabalhadores usassem fraldões para não precisarem abandonar os caixas para irem ao banheiro. "Então, terceirizar é degradar a condição humana no trabalho. Por isso é vital que o PL 4.330 seja impedido, porque ele invade o campo que ainda existe de trabalhadores estáveis nas empresas", concluiu.

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